Taioba, maniva, urtiga. Os nomes não são muito amigáveis – nem suas
donas. São plantas que, em seu estado natural, podem ser até perigosas.
Mas basta um bom e vigoroso trato para virarem insuspeitas iguarias
Ela adora clima quente, solo úmido e sombra. De cultivo fácil,
cresce em qualquer quintal, rende inúmeras receitas e substitui à altura
o espinafre e a couve. Ainda assim, a taioba está longe de ser popular.
Um dos motivos, certamente, é a falta de conhecimento dos consumidores –
e até dos produtores – para diferenciar a mansa da brava. Ambas têm
oxalato de cálcio, mas o alto teor da segunda a torna muito tóxica.
Daí a importância de saber a diferença entre as duas e sempre
escaldar mesmo a taioba mansa antes de usar. Aferventar as folhas é o
melhor jeito de eliminar o oxalato de cálcio. A nutricionista Neide
Rigo, do blog Come-se, cresceu consumindo taioba no sítio do pai e até
hoje a cultiva por lá. "É versátil, fica uma delícia só refogada com
alho e azeite ou em polentas, bolinhos e massas."
Faz seis meses que o gastrônomo italiano Roberto Smeraldi se dedica
ao estudo da taioba (leia abaixo). Começou fazendo suflê para os filhos.
Os meninos também foram os primeiros a aprovar outra invenção do pai:
torta de taioba com amêndoa e cacau em pó. De um tacho de taioba
refogada lentamente, Smeraldi ainda tira o recheio do ravióli, o tempero
da farofa e o corante do nhoque. Ele a compra na barraca de Ayako
Fukushima, na feira de sábado da Rua Diogo Jácome, na Vila Nova
Conceição.
A chef Carla Pernambuco, do Carlota, também coleciona receitas com a
folha. "Mas é como fruta da estação. Só uso quando tem", diz a chef.
Se encontrar taioba nem sempre é fácil, pior é receber uma brava por
engano, como aconteceu com Helena Rizzo. "Passei muito mal, tive uma dor
de garganta forte, sufocante", conta a chef, que conheceu as folhas ao
provar o prato de uma ex-funcionária. Gostou tanto que criou uma
releitura para o menu-degustação: caruru de taioba, peixe empanado no
mandiopã e taioba salteada – hoje a recebe de um "cuidadoso produtor
orgânico".
Certa vez, depois de servir charutinho de taioba a um cliente, o chef
e consultor Paulinho Martins foi chamado às pressas ao salão. O cliente
sentiu a boca picar e a garçonete, muito sincera, disse que taioba
mansa não pica, já a brava... pica e mata mesmo! O chef comeu um pedaço
de taioba – e não morreu. Descobriu que o que ardia era a pimenta do
molho que acompanhava o prato.
Por qual mistério a taioba não faz parte da mesa do brasileiro?
Roberto Smeraldi*Existe uma diferença
entre a taioba e os outros inúmeros ingredientes nativos brasileiros que
os mercados desconhecem, desprezam e desperdiçam. Quase sempre são
delícias de nicho, com gosto sofisticado, apelo exótico mesmo em pátria,
que tendem a ser compreendidas por gastrônomos refinados ou chefs
obcecados por pesquisa e novidades.
Caros, além de raros, dependem de delicados equilíbrios ambientais,
requerem investimentos em tecnologia e valorização dos saberes
tradicionais. A taioba não, nada disso. Desde que comecei a apreciá-la
aumenta o mistério de por que não faz parte da mesa do brasileiro no dia
a dia.
Seu preparo é facílimo e rápido: não precisa limpar nada, é só cortar
grosseiramente e jogar numa frigideira com poucas gotas de gordura e
uma pitada de sal, e ela desmancha sozinha. Não precisa eliminar nada:
até o talo central em poucos minutos vira purê. Seu gosto é delicado,
mesmo com personalidade. Não identifiquei rejeição em pessoas de
qualquer idade, cultura e origem: praticamente unanimidade, inclusive
pela textura macia. Sua versatilidade é superior àquela das verduras que
abundam nas bancas de nossas feiras: taioba realmente combina com tudo.
Em termos nutricionais e medicinais, é o sonho dos nutricionistas.
Fonte: Estado de SP